Luis Alberto Melo, mais conhecido como Luis Melo, é um ator curitibano que se destaca na dramaturgia brasileira. Ator consagrado, Melo já ganhou os maiores prêmios de dramaturgia do Brasil como o “Molière”, “Shell de Teatro”, Prêmio Qualidade Brasil, Prêmio Associação Paulista de Críticos de Arte e o Prêmio Mambembe.

Apaixonado pelas artes o ator idealizou e construiu o Campo das Artes. O Campo das Artes é uma iniciativa privada, sem fins lucrativos, com a possibilidade de parcerias com órgãos públicos ou iniciativas privadas, e Melo complementa “Eu acredito que ninguém é obrigado a embarcar no seu sonho, mas a partir do momento que seu sonho começa a se estruturar qualquer outro tipo de parceria é bem vinda!”. Quer saber mais sobre esse sonho e esse espaço multidisciplinar?! Confira abaixo a entrevista na íntegra: 


Melo, por quê trazer a arte ao campo? 

A arte ela se encontra em todos os lugares sejam espaços públicos, sejam nas comunidades, em áreas de risco, dentro das escolas, dentro das universidades, enfim, ela sempre foi um veículo transformador, pois através da arte as pessoas conseguem se comunicar com mais facilidade assim como seus desejos, anseios, e a realidade que elas gostariam de transformar isso se dá através da arte.

Esse sonho é consequência de uma trajetória artística, sempre voltada ao teatro, a pesquisa de novas linguagens, a integração e a relação entre todas as artes -elas não estão separadas-, o teatro inclui: as artes plásticas, a música, a dança, a fotografia, a literatura, a engenharia, a ciência, a medicina. A arte engloba muitas coisas elas sempre estão muito inter-relacionadas, e você dentro disso tudo vai ampliando sua sensibilidade, sua capacidade de relacionar as coisas, e fazer com que elas interajam.

Além do curso permanente na Fundação do Teatro Guaíra em Curitiba, a minha formação em São Paulo foi no Centro de Pesquisa Teatrais (CPT) do SESC, onde existia um espaço de criação, e ali a arte era pesquisada com tempo, sem a pressão de ter um resultado final o importante era o processo, o autoconhecimento, o desenvolvimento de uma técnica, de um repertório, ali foi o meu amadurecimento, minha estruturação artística. Havia toda uma infraestrutura disponível como cenografia, sala de vídeo, biblioteca, a possibilidade de acesso às exposições de grandes artistas, enfim, ter uma formação artística mais completa.

No Brasil para você sobreviver da sua arte, a televisão é inevitável, dá uma visibilidade que facilita a concretização de diversos sonhos, e a televisão funcionou assim comigo. Com a minha entrada na televisão me afastei do SESC, que exigia dedicação em tempo integral. Nesse momento pensei em voltar para Curitiba, porque eu sempre acreditei que Curitiba era a cidade ideal para o teatro de companhias, de grupos, de uma pesquisa mais continuada, ela tinha uma tranquilidade, não tinha o corre-corre, essa coisa da sobrevivência de uma grande cidade, e eu acreditava que ali as coisas poderiam acontecer mais facilmente, assim como a própria locomoção.

Com minha volta à Curitiba, minha cidade natal, aconteceu a criação do ACT (Ateliê de Criação Teatral) em parceria com a, atriz e produtora, Nena Inoue e o cenógrafo Fernando Moraes. No ACT ficou claro que era possível, sim, as coisas serem produzidas em Curitiba, amadurecer as ideias, ser apresentado ali e dali poder fazer uma trajetória Nacional, de uma forma que as pessoas voltassem o seu olhar para Curitiba, pois antes as peças nasciam em Curitiba e morriam ali mesmo, não havia uma repercussão nacional… e eu sabia que isso era possível, esse foi o meu principal objetivo de trabalho no ACT.

E, como havia o espaço para pesquisa do teatro, por que não oferecer esse espaço também as outras áreas?! A dança, literatura, artes plásticas, numa conexão muito forte. Trazer essa convivência, e essa relação, para que esse diálogo trouxesse dispositivos para o desenvolvimento das artes no Paraná, e nós cumprimos a função, porque dali em diante vários jovens montaram suas companhias, seus coletivos, pensando na possibilidade de se ter um espaço de criação, não somente para o resultado final, mas também no processo de feitura do espetáculo.  

O ACT começou a ser muito procurado e o espaço se tornou pequeno. Nos tornamos ponto de referência tanto nacional, quanto local, mas ficávamos muito mais tempo respondendo solicitações – de ordem mais administrativa- do que “criando”, e com as dificuldades de apoio tanto da iniciativa privada quanto do poder público e nesse momento decidi buscar um lugar mais afastado, com tranquilidade, com a possibilidade de residências artísticas, e assim ter os artistas integrados com a arte, a população a geografia, e ter um tempo também dedicado somente a criação sem as interferências de um grande centro. 

De onde veio a inspiração para criar o Campo das Artes?

É um projeto de vida, que vai se formando conforme as atividades. Eu tive a oportunidade de visitar muitas residências artísticas, viajando com o teatro durante 10 anos, e esses espaços culturais fora do Brasil, faz com que as pessoas saiam do centro de Paris, por exemplo, para irem até uma cidade mais próxima assistir um espetáculo, uma exposição, um festival. Esse tirar as pessoas das grandes cidades e consumirem a arte fora dos espaços tradicionais sempre foi um desejo meu.

E, como conheceu São Luiz do Purunã e por que escolheu esse lugar para construir o Campo das Artes?

Bom, eu conheci através do Beto Bruel, que é um dos maiores iluminadores do mundo, e ele sempre foi um grande colaborador, muito dedicado a formação de novos profissionais de sua área. 

Acompanhando minha procura após a ATC, o Beto me disse que eu teria que conhecer São Luiz do Purunã, e assim que conheci me encantei com a região. Com certeza é uma das regiões mais lindas do mundo, com sua beleza exuberante, a Escarpa Devoniana, os Campos Gerais, as Florestas de Araucária, o Caminho dos Tropeiros… As pessoas me perguntam o “porquê de São Luiz do Purunã? ” e eu não sei explicar, quando você vê você já está em São Luiz do Purunã. Acho que é uma questão de energia que existe nesse lugar, sem você perceber você já está envolvido, defendendo esse patrimônio, procurando se relacionar com a comunidade. Hoje agradeço muito ao Beto, além de me apresentar o distrito é um dos maiores incentivadores do Campo das Artes.

Melo, quais foram os maiores desafios? 

Sobre os maiores desafios é justamente uma questão de logística, pois tudo fica mais difícil para você construir no campo. 

O clima nos Campos Gerais, é um clima onde você precisa ter construções mais estruturadas e mais aquecidas para ter um conforto térmico, pois a natureza é muito imponente, então tudo é muito intenso: a chuva, o vento, o sol, as tempestades, essa região de arenitos, área rochosa, as águas que não chegam a penetrar no solo… então as construções necessitam ser mais altas. Enfim, são muitos detalhes logísticos para trazer esse mínimo de conforto e segurança.

Então, a dificuldade foi de encontrar profissionais que entendessem como funciona o clima da região, e que trabalhassem com foco na sustentabilidade, na reciclagem de materiais. Queria que o Campo das Artes fosse um laboratório para pesquisa de novos materiais e reutilização, queria dar um novo significado a alguns materiais, principalmente para materiais de construção. Esse foi um dos maiores desafios aqui em São Luiz do Purunã, mas com o auxílio dos arquitetos JC Serroni e do Renato Santoro, foi possível a viabilização do projeto que eu almejava para o Campo das Artes.

E qual é a proposta, e o objetivo do Campo das Artes? 

O maior objetivo do Campo das Artes é garantir a tranquilidade para o desenvolvimento dos projetos culturais e oferecer uma infraestrutura básica, necessária, para o atendimento ao público visitante, o consumidor da arte. O C.A. tem como missão promover a valorização da arte e da cultura, criando esse ambiente de encontro de pessoas, pesquisa, produção, apresentação de ações artísticas culturais e sempre em sinergia com a comunidade de São Luiz do Purunã e a paisagem cultural dos Campos Gerais.

Quais são os públicos alvo do Campo das Artes? 

Existem três públicos principais, divididos em dois segmentos que seriam os Projetos Culturais e os Projetos Sociais, de formação e educação. 

O primeiro deles são os moradores da região, tanto do distrito de São Luiz do Purunã como das regiões mais próximas. É um trabalho com os alunos, com as escolas, com as associações, seja de artesanato ou de moradores, a ideia é que as coisas possam ser descobertas, discutidas e conversadas e que a gente possa criar um projeto de oficinas de ouvir um pouco quais são as necessidades deles que são públicos dos projetos sociais.

Outro público alvo são os artistas que vão fazer utilização do Campo para uma imersão com projetos de residências para desenvolvimento de projetos de criação, seja na área da música, do teatro, do audiovisual, da educação, da dança, e ao mesmo tempo vão atuar em conjunto nos projetos sociais com a comunidade. Com essa comunidade artística e também com a comunidade artística local, para que essa relação esse encontro aconteça, como também, os alunos e professores das universidades e escolas, possam fazer um passeio tanto para visitação, como para desenvolver um dia no campo, uma oficina ou uma conversa. 

Existe ainda a possibilidade de fazer intercâmbios entre artistas estrangeiros com artistas regionais brasileiros. Esse intercâmbio cultural com outros países se utilizando de apoio do poder público também da iniciativa privada, ou mesmo de projetos que sejam desenvolvidos fora e que contemplem os artistas para permanecerem aqui no Campo das Artes para desenvolver algo com a população local.

E por fim, temos os turistas. As pessoas que vêm para São Luiz do Purunã podem tanto visitar o Campo das Artes como as exposições, ou até mesmo alguma atividade que esteja acontecendo ou simplesmente fazer uma programação de final de semana de um dia de arte no campo. Em breve, também será possível visitar a loja do rural contemporâneo para que as pessoas consumam o que é produzido aqui e na região. 

Melo, qual estrutura que o Campo das Artes conta atualmente?

Basicamente o Campo das Artes é um espaço essencialmente multidisciplinar que tem como objetivo valorizar sempre o encontro, a pesquisa, os processos, e principalmente em promover essas intersecções entre as mais diversas linguagens artísticas na área do conhecimento, como uma arte, o design, a gastronomia.

Espaço Multiuso: Espaço versátil com capacidade para 200 pessoas, esse espaço pode abrigar apresentações de teatro, dança, música, exposições, palestras, workshops e as mais diversas atividades em grupo.
Espaço Convivência: Ambiente descontraído com vista para a paisagem da Serra de São Luiz do Purunã. No mezanino, conta também com um espaço de café/bar junto à uma aconchegante sala de estar.

O Campo das Artes tem muitas possibilidades a serem desenvolvidas, como já citei anteriormente os projetos educacionais na prática através de parcerias, nós cedemos o espaço físico e a troca de experiências, com o intuito de despertar a curiosidade, o interesse, das crianças, dos jovens pelo novo, pela arte, iluminação e o seu todo. Procuro sempre estar fazendo parcerias com universidades, parcerias com escolas, instituições, e associações. 

E, também o desenvolvimento das residências artísticas, em nossa estrutura contamos com refeitório, lavanderia e um alojamento próprio para receber grupos para que os residentes venham e residam por um período, temos também horta e estufa, para que as pessoas possam inclusive plantar aquilo que irão consumir.

1) Pátio: Com vista para a deslumbrante paisagem da Serra de São Luiz do Purunã. 2) Lago: Rodeado por deques de madeira e um amplo gramado com parquinho infantil. 3) Estufa e Horta: Espaços voltados ao cultivo de orgânicos.

Existe a parte da oficina de marcenaria e serralheria, para a produção de cenários, de montagens para exposições, confecção de vitrines para lojas e shoppings. É um ponto de formação, da mesma maneira que investimos na formação de novos iluminadores, na elétrica, e na sonorização. Nosso foco não é apenas na manutenção, mas que os participantes também participem dos processos de criação.

1) Galpão Amarelo: Área comum para as refeições, com cozinha industrial e lavanderia compartilhada. 2) Casa Azul: Para até 30 pessoas, ideal para residências artísticas e atividades de imersão. 3) Casa branca: Alojamento para até 09 pessoas.

O Campo das Artes é um espaço multiuso mesmo! Aqui nós pensamos que uma coisa não tenha uma utilidade só, mas que possa ser usado das mais variadas formas possíveis.   


1) Sala de Produção: Sala de suporte às equipes de produção permanentes ou eventuais. 2) Ateliê Loja: O espaço pode abrigar oficinas e pode funcionar também como espaço de comercialização de trabalhos de designers e artistas. 3) Ateliê Oficina: Espaço de suporte para trabalhos que envolvem marcenaria, serralheria, cenografia, bem como para armazenamentos de materiais e ferramentas.

E, qual a mensagem que você deixa para quem está lendo essa entrevista?

A mensagem que eu deixo para quem nasceu em São Luiz do Purunã, para quem mora, para quem visita, para quem adotou e para o empreendedor de São Luiz do Purunã é algo muito simples, peço que conheçam, que divulguem, que cuidem, que respeitem, que defendam e que se orgulhem de São Luiz do Purunã, porque é um privilégio para todos nós estarmos aqui.

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Entrevista com Luis Alberto Melo, ator brasileiro, formado pelo Centro de Pesquisas Teatrais, idealizador do Campo das Artes, e morador de São Luiz do Purunã.