Uma pequena história
Na antiguidade as áreas verdes destinavam-se essencialmente ao uso e prazer de imperadores e sacerdotes. Na Grécia tais espaços foram ampliados não só para passeios mas também para encontros e discussões filosóficas. Na Idade Média as áreas verdes foram formadas no interior das quadras e depois desaparecem em decorrência do crescimento das cidades. No Renascimento, transformam-se em gigantescas cenografias formais, evoluindo no Romantismo como parques urbanos e lugares de repouso e distração.
Com o surgimento das indústrias e o crescimento das cidades os espaços verdes deixaram de ter função apenas de lazer mas passaram a ser uma necessidade urbanística, de higiene, de recreação e de preservação do meio ambiente urbano. Le Corbusier, citando a Carta de Atenas: “todo bairro residencial deve contar com a superfície verde necessária para a ordenação dos jogos e desportos de crianças, adolescentes e adultos” e que as “novas superfícies verdes devem destinar-se a fins claramente definidos: devem conter parques infantis, escolas, centros juvenis ou construções de uso comunitário, vinculados intimamente à vivenda”.
Os espaços verdes nos centros urbanos, além da relevância ambiental, sanitária, estética e cultural, são destinados ao lazer e à recreação. Pode-se conceituar lazer como sendo o tempo livre, a folga, o descanso, e recreação como sendo o divertimento, o prazer, a ocupação agradável que visa o entretenimento.
O Jardim Através do Tempo
Jardim Mesopotâmico, construídos em elevados artificiais (zigurats), com funções religiosas e para grandes celebrações, locais de concentração politica e religiosa, com sistemas artificiais de irrigação.
Jardim Grego, sem formas organizadas, com esculturas realistas de pessoas e animais, lugares naturais e funcionais, dedicados aos deuses, com flores e frutos, para encontros e discussões filosóficas.
Jardim Medieval, também conhecido como Jardin de curé, normalmente nos terrenos de uma abadia, tinham a característica de misturar flores e legumes, ervas medicinais, etc.
Jardim Renascentista, surgiu no final de século 15, na Itália, inspirado nos ideais clássicos de ordem e beleza, destinados à contemplação e o gozo da vista, sons, cheiros, etc.
Jardim Barroco, tinha a função de alimentar os sentidos e a emoção, através de efeitos decorativos e visuais.
Jardim Romântico, originado na Inglaterra, exprime naturalidade, sem ordem lógica, sequencia de paisagens diferentes entre si, para passeios e contemplação.
Jardim Contemporâneo, mistura os estilos, alia o paisagismo à arquitetura, destacando sobretudo a naturalidade do ambiente ecologicamente equilibrado.
Sobre a Paisagem
A idéia de Paisagem está associada à necessidade humana de configurar a noção do belo com a contemplação da natureza. A paisagem envolve uma difusa variedade de componentes, incluindo história, valores espirituais, significados estéticos, relações sociais e concepções da Natureza, e em decorrência de sua vinculação com o tempo a paisagem provoca interações entre o presente e o passado, uma espécie de memória que armazena a história dos sucessivos períodos da atividade humana sobre a Terra, e atribui aos indivíduos uma sensação de identidade.
A Paisagem é um dos aspectos do ambiente, é o que se vê, sendo composta por elementos naturais (topografia, fauna, vegetação) e construídos. Sendo criação da mente humana, está também associada às interferências que provocam as criações, utilitárias ou simplesmente estéticas. Para o paisagista é importante entender com precisão o que a paisagem significa, isso definirá não só o que fará para o desenvolvimento de suas atividades mas principalmente o que dirá e qual a direção a seguir.
O berço da atividade paisagística foi a lida com o jardim, na tentativa de criar um ambiente protegido onde cultivar alimentos e essências, mas também trazer a estética natural, bela por excelência, para perto de si, por isso possui intrinsecamente um matiz de construção social, enquanto dependente da apreciação humana.
A criação de praças e parques está relacionada ao sonho do homem de viver em mítico acordo com a natureza, e vem de muito tempo, está na história do paraíso, contada no Livro do Gênesis. A imagem do espaço entre os muros ganhou os contornos do local onde o homem pode triunfar sobre a fragilidade e a imperfeição humana – daí derivou a ideia do jardim como um ideal utópico, que tem servido, ao longo da história da humanidade, como modelo para um futuro melhor e mais feliz. Esse sonho ancestral quando ganhou contornos também ganhou um nome: “pairi-dae’za”, palavra persa que simplesmente significa “entre muros”, e não apresenta nenhum significado para o que está dentro deste espaço separado e protegido.
Desta forma, estes espaços tem sempre significado um sonho estruturado que representa a possibilidade de recuperar o paraíso perdido – o caminho para este objetivo é o da reconciliação com a natureza, e esta reconciliação somente pode ter sucesso através da esfera da arte – esta dimensão pode, uma vez mais, tornar novamente a natureza bela.
Os jardins unem a beleza artificial e a natural, abraçando todos os elementos: água, luz, ar, crescimento, tornando-os elementos de arte.
Todos os esforços devotados ao desenho de um jardim refletem o desejo de felicidade em harmonia com a natureza – mais importante que o seu uso como fonte de proteção, alimento, medicamentos e reserva de suprimentos é sua habilidade de prover momentos de lazer prazeroso – o pó de cada dia, as tormentas e espinhos dos dias de trabalho estão excluídos deste lugar.
No entanto, nenhum lugar de sonho, nenhuma ilha fantástica, pode existir sem referências à realidade – é o desafio a esta realidade que constrói o sonho de poder existir sem opressão.
É aí que se encaixa o desenho e a construção de uma área verde, e é aí também que se encaixa, modernamente, a sustentabilidade do espaço formado.
Há hoje em dia, sem dúvida, concordância quanto ao fato de que os princípios que regem a organização destes espaços emergem de sua situação física, e isto está ligado intimamente às suas características ecológicas.
Nos últimos anos, sem prejuízo do foco ecológico, o mundo vêm descobrindo, ou redescobrindo, a paisagem, e a partir dela, o belo natural, já não mais no seu sentido convencional de formas, cores e sons, mas enxergando beleza na própria diversidade da Natureza. Pode-se dizer que, na perspectiva atual, o belo deixa de ser somente uma percepção extrínseca em proveito de uma percepção intrínseca, que valoriza os “segredos”da natureza, a apreciação estética vai do que vemos, sem grande esforço (montanhas, o verde das plantas, a vitalidade dos rios), ao que não vemos (as relações ecológicas, a qualidade das águas, a diversidade das florestas), só sentimos intuitivamente, ou só notamos com o auxílio dos especialistas.
A assimilação deste conceito vem ganhando legitimidade e a valoração dos recursos ambientais – ativos ambientais – tende a estabelecer uma nova relação: sociedade/recursos naturais, condizente com as possibilidades de produção propiciadas pelo avanço de tecnologias e a consequente mitigação dos impactos ambientais, a reutilização de rejeitos como insumo para reciclagem, entre outros.
A paisagem é sempre uma experiência humana, na medida em que o belo é uma realidade apenas aos olhos de quem vê. Não deixa de ser uma noção de caráter antropocêntrico, mas nem por isso perde seu valor, pois não rejeita influências biocêntricas e ecocêntricas. É nessa última acepção que se pode falar em beleza do meio ambiente ecologicamente equilibrado. Para muitos, a paisagem deixa de ser a relevância da beleza de um fragmento natural e ressurge como um atributo holístico da própria natureza, de toda a natureza.
Já em meados do Século XVIII expande-se a noção de paisagem rural, uma apreciação mais robusta da Natureza, para ir além e incluir montanhas, desertos e oceanos. Esse movimento ganha dimensão internacional no final do Século XIX, consolidando-se no Século XX por força do abandono dos centros das cidades em favor dos subúrbios, em busca da paisagem natural, nesse processo paradoxalmente ampliando o contraste entre o urbano e o rural, como duas entidades totalmente distintas. Em muitas partes do mundo, após 1945, os que residiam nas cidades passaram a valorizar a Natureza intocada, que deixou de ser vista como terra de ninguém ou desperdício de recursos, mesmo quando não explorada no sentido tradicional.
É nos anos 60, pelas mãos de multidões que protestavam contra os abusos e degradações sofridos pela Terra que a paisagem ganha, em definitivo, um lugar central nas agendas. Nessa fase, já não era apenas o belo “particular” de uma montanha ou rio que importava mas o belo da integridade do Planeta.
Mas, independente da recriação de paisagem, da identificação de conjuntos ou elementos paisagísticos, ou da simples recomposição visual do entorno, é preciso proteger o que foi criado. A proteção da paisagem tem sido assim um longo e inacabado processo histórico, e necessita ser detalhada em todas as circunstâncias de criação.
O objetivo do Paisagismo executado com o auxílio da vegetação nativa, é acompanhar as formas como a natureza se estrutura, para que, ao longo do tempo, esta vegetação se torne capaz de uma sobrevivência saudável, sem a necessidade onerosa de grandes manutenções, nas várias etapas de sua vida.
E por vegetação nativa entendemos o conjunto das espécies vegetais que naturalmente se organizam para viver em determinados ambientes, sejam biomas, ecossistemas, etc.
E também é parte essencial do projeto paisagístico a atenção com as questões relativas ao relacionamento/comportamento das pessoas na sua relação com à vegetação implantada, ao ordenamento dos processos de circulação e de ocupação dos espaços utilizados no ambiente externo, juntamente com a formação adequada do ambiente para o correto ajustamento aos processos naturais e ao desenvolvimento das plantas.
O Planejamento da Paisagem
É uma teoria do planejamento que incorpora a avaliação das potencialidades (limites e aptidões) da natureza e sua paisagem, em áreas urbanizadas ou não, para acolher os usos humanos.
É um instrumento de proteção e desenvolvimento da natureza com o objetivo de salvaguardar a capacidade dos ecossistemas e o potencial recreativo da paisagem, como partes fundamentais para a vida humana.
Conclusão
O trabalho paisagístico deve se apoiar em abordagens naturalistas para a jardinagem, com o uso de variedades de plantas perenes, no universo das espécies nativas.
Tomando como sugestão o design arquitetônico, prioriza-se o ciclo de vida sazonal de uma planta sobre considerações decorativas como flor ou cor. Concentra-se principalmente em características estruturais, como forma de folhas ou sementes, presentes antes e depois da planta ter florescido.
Um jardim é emocionante quando parece ser bom durante todo tempo, não apenas em momentos particulares.
A estabilidade das plantas perenes após o plantio é fundamental, especialmente com o uso de misturas de espécies, formadoras de aglomerados de longa duração, devido à mudança de perspectivas estéticas para outra formada pela ecologia. O resultado são jardins que persistem nos anos depois de plantados.
“ Feche os olhos e aguce os ouvidos, e da mais leve respiração ao mais selvagem ruído, do som mais simples à mais sublime harmonia, é somente a Natureza que fala, revelando sua existência, seu poder, sua vida, suas relações e estruturas, de tal modo que até um cego é capaz de apreender o que é infinitamente vivo.”
Johann Goethe
Este artigo foi escrito pelo paisagista Carlos Oliveira Perna.
Erechim – Primeiro de maio de 2020